
Da poeira do sertão brasileiro às galerias internacionais, o fotógrafo que revelou a alma humana em preto e branco e mudou a forma como o mundo enxerga conflitos, desigualdade e natureza.
Faleceu hoje em Paris, Sebastião Salgado, fotógrafo brasileiro premiado e reconhecido em todo o planeta. Ele redefiniu os limites do fotojornalismo ao unir denúncia social, arte e sensibilidade. Com trabalhos que vão da fome no Sahel africano aos trabalhadores das minas de Serra Pelada, Salgado construiu um legado que ultrapassa fronteiras e inspira novas gerações. Suas imagens, publicadas por veículos como The Guardian, BBC, O Globo, CNN e The New York Times, provocam reflexão e empatia, revelando as dores e belezas do ser humano.
Em mais de quatro décadas de carreira, Salgado caminhou por zonas de conflito, florestas intocadas e regiões devastadas pela pobreza. Fez da fotografia não apenas um ofício, mas uma missão de vida. Suas lentes capturaram tanto o sofrimento quanto a esperança, criando um acervo visual que mistura denúncia, poesia e humanidade. Morto aos 81 anos, Salgado colheu reconhecimento internacional, enquanto seu legado se consolida como um dos pilares do fotojornalismo moderno.
Do Brasil para o Mundo: A Jornada de Salgado
Nascido em Aimorés, interior de Minas Gerais, Sebastião Salgado cresceu entre a poeira do campo e as histórias do Brasil profundo. Formado em economia, abandonou a carreira estável em Paris para seguir sua paixão: retratar o mundo através da fotografia. “Nunca fui apenas um espectador”, declarou ao The Guardian. Suas primeiras grandes reportagens, publicadas em veículos como O Globo e BBC, já traziam a marca registrada: a busca pelo humano, mesmo em cenários de extrema adversidade.
Foi nos anos 1980, cobrindo a fome no Sahel, na África, para a agência Magnum, que Salgado ganhou projeção internacional. As imagens cruas e intensas revelaram ao mundo o drama de populações esquecidas, sensibilizando governos e organizações. A série rendeu prêmios e abriu portas para colaborações com jornais como The New York Times e CNN. Em cada clique, uma história de dor – mas também de resistência.
Humanidade em Preto e Branco: O Estilo Salgado
Salgado tornou-se sinônimo de fotografias em preto e branco, densas, quase palpáveis. A ausência de cor não diminui o impacto; ao contrário, amplia a dramaticidade. “O preto e branco tira o excesso e revela a essência”, explicou em entrevista ao UOL.
O fotógrafo não apenas captura imagens, mas constrói narrativas. Em Serra Pelada, no Pará, retratou milhares de homens cobertos de lama, em busca de ouro, como se fossem formigas num formigueiro humano. Os flashes registraram o suor, o cansaço, o cheiro forte da terra molhada. Em “Êxodos”, percorreu mais de 40 países para documentar o deslocamento de populações, levando o leitor a sentir o frio de campos de refugiados e o silêncio de desertos esquecidos.
O Impacto Social: Imagens Que Mudam o Mundo
A força do trabalho de Salgado ultrapassa o universo artístico. Suas fotografias já foram exibidas em galerias de Londres, Paris e Nova York, mas também serviram de alerta para crises humanitárias. Organizações como a ONU e Médicos Sem Fronteiras usam suas imagens para sensibilizar o público e arrecadar fundos.
No documentário “O Sal da Terra”, dirigido por Wim Wenders e seu filho Juliano Salgado, o impacto das fotografias ganha dimensão ainda maior. O filme, elogiado por veículos como BBC e The Guardian, mostra como cada projeto de Salgado é uma imersão física e emocional, com consequências profundas para quem fotografa – e para quem vê.
Natureza e Esperança: O Projeto “Gênesis” e o Futuro do Planeta
Após anos documentando sofrimento e destruição, Salgado voltou seu olhar para a regeneração. No projeto “Gênesis”, explorou regiões intocadas da Terra, das florestas amazônicas à Antártica. As imagens mostram paisagens quase míticas, animais raros e povos isolados, sugerindo que ainda há esperança para o planeta.
Junto com sua esposa, Lélia Wanick Salgado, lidera o Instituto Terra, organização dedicada à recuperação ambiental do Vale do Rio Doce. O casal plantou milhões de árvores, mostrando que a transformação começa em casa. “A fotografia denuncia, mas também pode inspirar”, afirmou Salgado à CNN.
O Legado: Inspiração Para o Fotojornalismo Mundial
Sebastião Salgado transformou o fotojornalismo em arte e ação. Suas imagens mudaram políticas públicas, mobilizaram instituições e influenciaram gerações de fotógrafos. O reconhecimento é global: prêmios como o Príncipe das Astúrias e exposições nos principais museus do mundo.
Mais do que belas imagens, Salgado nos convida a enxergar o outro – a sentir o cheiro do chão molhado, o frio da manhã, o silêncio da dor. E, principalmente, a não sermos indiferentes.
Futuro
No mundo acelerado das redes sociais, onde a superficialidade muitas vezes domina, o legado de Sebastião Salgado é um chamado à profundidade. Suas fotos continuam ecoando, provocando reflexões e inspirando empatia. Em cada retrato, a pergunta: o que faremos com as histórias que vemos? O futuro do fotojornalismo – e do planeta – depende de olhares atentos e corações abertos.