Papa Francisco e os rituais do último adeus: como funcionam os funerais tardios

Velório em Roma desperta curiosidade sobre técnicas de conservação de corpos em cerimônias prolongadas.

O velório do Papa Francisco, que teve início na quarta (23) e se estende até amanhã, sábado (26), em Roma, vai além do luto e da espiritualidade: ele também levanta questões curiosas sobre o que acontece com o corpo durante tantos dias de homenagens. Afinal, como é possível manter a dignidade e o aspecto sereno de um líder mundial exposto por tanto tempo?

Com três dias de caixão aberto e fiéis de todo o mundo formando filas para o último adeus, a despedida do pontífice nos convida a entender os bastidores dos chamados funerais tardios — cerimônias que, como a da Rainha Elizabeth II em 2022, demandam mais tempo, técnica e precisão para acontecerem sem imprevistos.

A arte de preservar a memória – e o corpo

A morte é um evento inevitável. Mas o modo como nos despedimos dos nossos líderes, heróis ou entes queridos pode ser meticulosamente preparado. No caso do Papa Francisco, o ritual de três dias exigiu uma preparação especial logo após seu falecimento: o embalsamamento.

“A ideia é simples: manter a serenidade no rosto e a paz no ambiente. Nada de odores, nada de desconforto. Só silêncio, orações e reverência.” — explica Roberto Santana, Diretor de Operações do Grupo Zelo.

Embalsamamento x Tanatopraxia: Entenda a Diferença

Você pode até pensar que é tudo a mesma coisa, mas não é. São técnicas distintas que partem de um objetivo em comum — preservar. Porém, os caminhos são diferentes:

  • Embalsamamento: técnica escolhida para o Papa. Permite conservar o corpo por até 30 dias, ideal para velórios mais longos ou translado entre países. Envolve a substituição do sangue por uma mistura de formol, álcool, água e corantes. É o que impede odores, inchaços e manchas visíveis.
  • Tanatopraxia: mais comum no Brasil, é recomendada para períodos de até 48 horas. Serve para funerais mais rápidos e normalmente não envolve dissecação interna profunda.

Ambas precisam ser aplicadas rapidamente após a morte. O tempo é o grande inimigo da dignidade nesse caso.

Etapas do Embalsamamento: Quase uma coreografia clínica

Para conservar o corpo do Papa, cerca de 10 litros de fluido foram utilizados. O procedimento seguiu três passos:

  1. Retirada do sangue, com limpeza interna;
  2. Dissecação e preparo das veias para receber os líquidos;
  3. Aplicação do fluido conservante, respeitando peso, altura e tempo de exposição.

Curiosidade: em casos como o do Papa, é preciso massagear as extremidades (dedos e mãos) para evitar coágulos visíveis. Pequenos toques, grandes resultados.

Necromaquiagem: Beleza em nome da memória

Imagine encontrar seu ente querido com aparência serena, pele com tonalidade saudável e sem vestígios do sofrimento que antecedeu sua morte. É isso que a necromaquiagem proporciona.

Essa técnica cuida da pele, unhas e cabelos, recriando, quando possível, a imagem da pessoa em vida. Ela é o toque final, muitas vezes imperceptível, mas essencial, que garante um adeus mais doce e respeitoso.

Muito além das personalidades: quando o embalsamamento é indicado

Apesar de parecer algo reservado à realeza, papas ou chefes de Estado, o embalsamamento também pode ser utilizado em:

  • Traslados internacionais;
  • Espera por familiares distantes;
  • Mortes violentas com necessidade de limpeza profunda.

Segundo Santana, a técnica está à disposição de qualquer família que deseje esse tipo de conservação. “É raro, mas não é um privilégio exclusivo. É uma escolha que também visa o conforto emocional dos enlutados.”

Uma despedida à altura

A morte, por mais dolorosa, pode ser um momento de beleza e conexão profunda. Os funerais tardios, como o de Papa Francisco, são uma coreografia entre ciência, fé e cultura — onde cada detalhe conta para que o último adeus seja digno, respeitoso e inesquecível.

Que sua memória permaneça. E que, mesmo na morte, o Papa siga unindo povos, crenças e histórias.