
O Japão enfrenta uma crise silenciosa, mas profunda: a escassez de trabalhadores está ameaçando o funcionamento de pequenas indústrias em áreas rurais, como na cidade de Ino, província de Kochi. Com pouco mais de 20 mil habitantes, o município viu sua principal fabricante de papel, a Wako Seishi, desligar parte das máquinas por não ter funcionários suficientes para operá-las. Esse é apenas um exemplo do que pode se tornar um colapso produtivo em escala nacional. A previsão é de que o país tenha um déficit de 3,4 milhões de trabalhadores até 2030 — número que pode chegar a 11 milhões em 2040, segundo estimativas do governo japonês.
No primeiro semestre de 2024, um número recorde de 182 empresas no Japão fecharam por não conseguir contratar mão de obra suficiente — um aumento de 66% em relação ao mesmo período de 2023. A situação é ainda mais preocupante em pequenas cidades, onde a população jovem migra para grandes centros e o envelhecimento avança. A resposta imediata do governo e da iniciativa privada tem sido a aposta em automação, uso de inteligência artificial e atração de trabalhadores estrangeiros.
Automação e robôs
Grandes empresas, como Panasonic e Nippon Paper, estão investindo pesado em sensores, câmeras e braços robóticos para substituir trabalhadores em setores fabris. Até restaurantes aderiram: redes como Yoshinoya e Osaka Ohsho usam robôs para lavar louças e inspecionar alimentos. Mas nem todos os setores conseguem automatizar suas atividades — construção civil, saúde e agricultura ainda dependem de força humana.
A presença de trabalhadores estrangeiros no Japão atingiu um recorde em outubro de 2024, com 2,3 milhões de imigrantes empregados no país, um aumento de 12% em um ano. Para conter a fuga de talentos para países que oferecem salários mais altos, o governo japonês vai reestruturar o programa de trainees estrangeiros a partir de 2027, permitindo que eles se qualifiquem para cargos mais elevados.
Imigração
Além da imigração, há um esforço para modernizar pequenas empresas e torná-las mais atraentes para jovens trabalhadores japoneses. Programas como o KaoNavi e o Persol Reskilling Camp oferecem cursos online com apoio de plataformas como a Udemy. Um fundo governamental de 417 milhões de dólares em cinco anos também foi criado para auxiliar empresas a automatizar linhas de produção, capacitar funcionários e melhorar os salários.
Para atrair jovens, companhias passaram a oferecer dormitórios corporativos, pagamento parcial de dívidas estudantis e outros benefícios, tática já adotada por gigantes como Nippon Life e Itochu. O governo também promove a jornada de trabalho de quatro dias semanais, embora a medida ainda tenha baixa adesão: apenas 8% das empresas oferecem três dias de folga por semana. Entre as exceções estão Uniqlo e Hitachi, que testam o modelo como forma de melhorar a qualidade de vida dos empregados.
Envelhecimento
Apesar dos avanços, especialistas alertam que as soluções atuais são paliativas. A desvalorização do iene reduz o atrativo dos salários para estrangeiros, e a escassa participação feminina no mercado de trabalho continua sendo um gargalo. Além disso, com 29% da população japonesa acima dos 65 anos, o país precisa de reformas estruturais urgentes para garantir sua sustentabilidade produtiva.
Se nada for feito, empresas como a Wako Seishi podem se tornar regra e não exceção. O Japão tem pressa: seu futuro econômico depende de uma força de trabalho que, ao menos por enquanto, está desaparecendo.