
Com o retorno de Donald J. Trump à Casa Branca, os Estados Unidos testemunham uma presidência moldada como um império empresarial em expansão. Os sinais são evidentes: lucros milionários em criptomoedas, imóveis de luxo no Oriente Médio, presentes estrangeiros de alto valor e, mais recentemente, o interesse direto no controle do TikTok – uma das maiores plataformas digitais do mundo.
O que se vê é um chefe de Estado que rompeu com precedentes éticos, transformando o cargo público mais poderoso do planeta em um canal de favorecimento a aliados, negócios familiares e influência pessoal.
O caso TikTok: um ativo político e financeiro
Em meio às tensões com a China, Trump prorrogou três vezes o prazo para a venda ou proibição do TikTok nos EUA, como previa a lei PAFACA (Protecting Americans from Foreign Adversary Controlled Applications Act), aprovada pelo Congresso em 2024. A justificativa? “Negociações avançadas”.
Na última semana, Trump declarou ter reunido um grupo de “pessoas muito ricas” para adquirir o TikTok nos EUA e prometeu revelar o comprador em até duas semanas. Entre os possíveis interessados estão os fundos Andreessen Horowitz, Blackstone, Silver Lake e KKR. O maior entrave está no coração do aplicativo: o algoritmo, cuja cessão depende da autorização do governo chinês.
Segundo especialistas em segurança e tecnologia, o TikTok é usado por cerca de 170 milhões de americanos, com 14% da população utilizando a plataforma para se informar. Um estudo recente revelou que o algoritmo tem viés de distribuição de conteúdo favorável a republicanos, o que pode ser explorado politicamente caso Trump ou aliados controlem a operação local.
Presidência como negócio
Desde seu primeiro mandato, Trump resistiu a colocar seus empreendimentos em “blind trusts”, como recomendam as normas de conduta da presidência americana. Agora, com o poder restaurado, consolidou ainda mais a simbiose entre governo e interesse privado.
Entre os casos mais emblemáticos:
- Presente do Qatar: Trump aceitou um Boeing 747 personalizado, avaliado em mais de US$ 400 milhões, oferecido pelo governo do Qatar como possível avião para sua fundação presidencial.
- Criptomoedas: sua família faturou centenas de milhões com moedas digitais temáticas e ações promocionais, incluindo jantares exclusivos leiloados com o presidente.
- Imóveis no Oriente Médio: aliados e empresas da Organização Trump fecharam contratos para empreendimentos em Omã, Dubai e Arábia Saudita, sob proteção política dos governos locais.
- Enfraquecimento institucional: órgãos de controle interno, como o Escritório de Ética Governamental e a Comissão de Supervisão, foram esvaziados.
Essas ações resultaram num salto patrimonial. A fortuna pessoal de Trump cresceu em mais de US$ 1,2 bilhão apenas entre março de 2024 e março de 2025, segundo análise do Financial Times.
Críticas e defesa
As críticas se acumulam nos setores democrata, jurídico e da imprensa independente. Acusam Trump de violar a cláusula constitucional dos “emolumentos”, que proíbe presidentes de aceitarem presentes e favores de governos estrangeiros sem autorização do Congresso.
Analistas de segurança alertam ainda para o risco de captura institucional: a concentração de poder midiático, financeiro e político em torno de uma figura e sua rede privada.
Em defesa, aliados alegam que Trump apenas faz “bons negócios” e que os norte-americanos “sabem no que votaram”. O próprio presidente afirmou em comícios que não tem obrigação de seguir “regras inventadas por burocratas de Washington”.
Impactos e projeções
Se concretizada, a aquisição do TikTok colocará uma plataforma com bilhões de visualizações mensais nas mãos de aliados do governo. Isso permitirá a Trump não apenas lucrar com publicidade e dados, mas também moldar o ambiente informativo e cultural entre jovens eleitores.
A médio prazo, cresce a pressão para o Congresso aprovar novas regras de ética presidencial, como a obrigatoriedade de venda de ativos ou criação de fundos independentes. A Suprema Corte, no entanto, tem mostrado resistência a interferir diretamente nas escolhas financeiras do presidente.
No plano internacional, o caso serve de alerta: governos de países como Índia, Brasil e França observam com atenção a fusão entre chefia de Estado e grandes plataformas digitais.
O que está em jogo não é apenas a posse de um aplicativo popular. É a transformação da presidência dos Estados Unidos em uma engrenagem de expansão comercial pessoal. De um avião presenteado pelo Qatar ao possível domínio sobre uma das plataformas de mídia mais influentes do planeta, Trump reescreve — e tensiona — os limites entre poder público e fortuna privada.
O futuro imediato traz um dilema: a democracia americana está disposta a aceitar uma presidência sob medida para os negócios de seu ocupante?
Box – Números que preocupam
- US$ 1,2 bilhão: aumento da fortuna de Trump em 1 ano
- US$ 500 milhões: ganhos familiares com criptomoedas
- 170 milhões: usuários do TikTok nos EUA
- 33%: usuários que consomem conteúdo político no app
- US$ 400 milhões: valor estimado do avião presidencial presenteado por Qatar