Três novas espécies de plantas da Mata Atlântica são descobertas no Espírito Santo

Após mais de 20 anos de estudos, cientistas identificam espécies raras em meio à sombra das florestas de Linhares.

Em pleno coração da Mata Atlântica, onde a luz do sol mal toca o solo sob a copa densa das árvores, três novas espécies de plantas foram reveladas após mais de duas décadas de pesquisa minuciosa. A descoberta, feita em uma reserva ambiental em Linhares, no Norte do Espírito Santo, lança luz sobre a riqueza ainda oculta de um dos biomas mais ameaçados do planeta.

As espécies, duas pertencentes à família das Marantaceae (popularmente conhecidas como Caetés) e uma ao gênero Solanum, revelam não apenas a resiliência da floresta, mas o empenho de pesquisadores e parabotânicos que há anos percorrem trilhas escondidas entre folhas e raízes para entender os mistérios da natureza.

Espécies que florescem na sombra: o segredo das Marantaceae

Em um canto silencioso da Reserva Natural Vale, longe do barulho das cidades, vivem duas das novas espécies identificadas: Saranthe rufopilosa, apelidada de Caeté-vermelho, e Ctenanthe brevibractea, conhecida como Caeté-joelho. Com até 80 centímetros de altura, essas plantas preferem o escuro — literalmente. Crescem sob sombra ou meia-sombra, longe da luz direta, e florescem discretamente entre os meses de dezembro e fevereiro.

As folhas largas e aveludadas, as inflorescências delicadas, e o ciclo de vida adaptado ao sub-bosque chamaram a atenção dos botânicos João Marcelo Alvarenga Braga e Fernanda Ribeiro de Mello Fraga, ambos do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, que descreveram formalmente as espécies em estudo publicado recentemente.

Essa descoberta reforça a importância da Mata Atlântica como um celeiro de biodiversidade ainda pouco conhecida — e, muitas vezes, ameaçada antes mesmo de ser identificada.

A terceira espécie: prima do tomate, do jiló e da berinjela

A terceira planta descoberta não tem o nome fácil, mas sua origem é igualmente fascinante. A Solanum phrixothrix, identificada nos arredores do baixo Rio Doce, pertence à mesma família de culturas bem conhecidas da cozinha brasileira: o tomate, o jiló e a berinjela. Ela representa um raro exemplo de planta silvestre do gênero Solanum que floresce de forma espontânea na floresta de tabuleiro.

A coleta do material botânico foi feita por Domingos Antônio Folli, parabotânico com mais de 40 anos de dedicação à flora capixaba. O espécime foi catalogado no herbário da Reserva Natural Vale e contou com o envolvimento de especialistas de peso internacional, como Sandra Knapp, do Museu de História Natural de Londres, Yuri F. Gouvêa, da Universidade Federal de Minas Gerais, e Leandro L. Giacomin, da Universidade Federal da Paraíba.

Mais do que ciência: um compromisso com o futuro da floresta

As três novas espécies não são apenas nomes em uma planilha de botânicos — elas representam a persistência da vida em meio à destruição, o potencial de descobertas em cada folha e a urgência de proteger o que ainda não conhecemos.

A Mata Atlântica, embora reduzida a cerca de 12% da sua área original, continua sendo uma das florestas mais biodiversas do mundo. Cada planta descoberta é um lembrete de que o conhecimento avança lentamente, mas precisa de um ambiente intacto para florescer — assim como as próprias espécies recém-identificadas.

A revelação dessas plantas também reforça o papel essencial das reservas privadas e do trabalho científico de longo prazo como ferramentas de conservação efetiva. Sem áreas protegidas como a Reserva Natural Vale e sem profissionais dedicados à ciência de campo, essas espécies talvez jamais fossem vistas, estudadas — ou salvas.

Um chamado silencioso vindo da floresta

No ritmo lento das plantas, há uma urgência: a de olhar para dentro das florestas antes que elas deixem de existir. As descobertas feitas em Linhares mostram que a Mata Atlântica ainda tem segredos guardados sob suas sombras. E que cabe a nós — como sociedade, pesquisadores, jornalistas e cidadãos — escutarmos esse chamado.

Afinal, o futuro da floresta não depende apenas da natureza continuar resistindo, mas de nós, humanos, escolhermos preservá-la.