
População preta sofre racismo diário em atendimentos, lojas e na saúde pública, segundo levantamento nacional.
Uma pesquisa inédita apoiada pelo Ministério da Igualdade Racial (MIR) revela um retrato alarmante da discriminação no Brasil: 84% da população preta afirma já ter sido vítima de racismo. O estudo, conduzido pelas organizações Vital Strategies Brasil e Umane, ouviu 2.458 pessoas em todo o país, entre agosto e setembro de 2024.
A metodologia incluiu perguntas sobre situações comuns de discriminação, como ser tratado com menos respeito, receber atendimento inferior em restaurantes e lojas ou ser seguido por seguranças. As respostas mostram como o preconceito está entranhado no cotidiano da população negra brasileira.
Racismo cotidiano atinge quase metade dos entrevistados
Entre os pretos, 51,2% disseram ser tratados com menos gentileza. O percentual é menor entre pardos (44,9%) e muito inferior entre brancos (13,9%). Quando se trata de ser tratado com menos respeito, os índices seguem a mesma lógica:
- Pretos: 49,5%
- Pardos: 32,1%
- Brancos: 9,7%
A disparidade se repete em outras situações: 57% da população preta afirma receber pior atendimento, enquanto 21,3% já foi seguida em lojas — mais do que o dobro dos pardos e brancos (ambos com 8,5%).
Mulheres pretas são as mais afetadas
O levantamento também investigou a ocorrência de múltiplas formas de preconceito. O grupo mais atingido é o das mulheres pretas: 72% relataram ter sofrido mais de um tipo de discriminação. Em seguida, aparecem os homens pretos (62,1%). Entre os brancos, as taxas são bem menores: 30,5% para mulheres e 52,9% para homens.
A cor da pele foi apontada como principal motivação para o preconceito por 84% dos pretos entrevistados. Entre brancos, apenas 8,3% associaram a discriminação à cor. Já entre os pardos, 10,8% relataram o mesmo.
Impactos na saúde e no bem-estar
Pedro de Paula, diretor da Vital Strategies Brasil, destacou os efeitos nocivos do racismo contínuo: “Isso impacta diretamente na saúde mental, no acesso a serviços e na autoestima das pessoas negras.” Segundo ele, o estudo evidencia a brutal desigualdade racial estrutural no Brasil.
A gerente de Investimento e Impacto Social da Umane, Evelyn Santos, reforça: “Essa foi a primeira aplicação da escala de discriminação cotidiana em nível nacional.”
O levantamento contou com apoio técnico da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e do Instituto Devive. O objetivo é fornecer dados para subsidiar políticas públicas de enfrentamento ao racismo, especialmente no sistema de saúde.
Racismo e desigualdade social andam juntos
Os números da pesquisa se somam a outros indicadores que escancaram o racismo estrutural no país. O Atlas da Violência aponta que pessoas negras têm 2,7 vezes mais chances de serem assassinadas. O Censo de 2022 revelou que pretos e pardos representam 72,9% dos moradores de favelas. Já os dados da PNAD Contínua mostram taxa de desemprego maior entre pretos (8,4%) e pardos (8%), em comparação com brancos (5,6%).
Para Pedro de Paula, o enfrentamento ao racismo precisa ser prioridade de todos os setores. “Governo, empresas, sociedade civil: todos devem assumir a responsabilidade de combater essa estrutura profundamente desigual.”
com informações da Agência Brasil