A guinada recente do comando do Congresso contra o Executivo — capitaneada por Hugo Motta (presidente da Câmara dos Deputados) e Davi Alcolumbre (presidente do Senado) — marca um momento de tensão profunda. As manobras que passaram a dominar a pauta legislativa, como o apoio à chamada “PEC da Blindagem”, tentativas de enfraquecimento da Polícia Federal e a aprovação de uma pauta-bomba no Senado, não são meras disputas políticas: configuram um risco direto à governabilidade, à segurança pública e ao Estado de Direito.
Com a indicação do advogado-geral da União, Jorge Messias, ao Supremo Tribunal Federal (STF), a insatisfação de Alcolumbre se transformou em ação imediata, escancarando o clima de retaliação política que se instalou entre Legislativo e Executivo.
A ofensiva de Hugo Motta: PEC da Blindagem e fragilização da PF
Nos últimos meses, Hugo Motta impulsionou esforços para ressuscitar a controversa “PEC da Blindagem” — um texto que pretendia restaurar prerrogativas para parlamentares, impondo, por exemplo, a exigência de autorização prévia do Congresso para investigações e ações penais contra deputados e senadores. Também ampliava a possibilidade de voto secreto em decisões cruciais envolvendo prisões e processos.
A iniciativa foi amplamente criticada por representar um claro retrocesso institucional. Mesmo não avançando no Senado, o simples fato de ser votada na Câmara já demonstrava a disposição de parte do Parlamento em enfraquecer mecanismos de controle, fiscalização e combate à corrupção.
Paralelamente, surgiram no Legislativo movimentos para reduzir a autonomia da Polícia Federal — interpretados como tentativas de autoproteção de parlamentares investigados. O alinhamento entre interesses corporativistas e pautas de enfraquecimento institucional reforça a falta de sintonia com as reais necessidades da população.
Alcolumbre: retaliação ao governo e risco fiscal para o país
A crise institucional atingiu outro patamar com a indicação de Jorge Messias ao STF. A decisão desagradou profundamente Davi Alcolumbre, que esperava ver seu aliado Rodrigo Pacheco nomeado para a vaga.
Em reação imediata, Alcolumbre colocou em votação uma medida considerada uma verdadeira pauta-bomba: a criação de um benefício com alto impacto fiscal para agentes comunitários de saúde e combate a endemias. A proposta, aprovada em tempo recorde, deve gerar um custo bilionário ao país nos próximos anos e foi interpretada como retaliação direta ao Executivo.
As consequências fiscais — em um momento em que o Brasil depende de estabilidade para atrair investimentos e preservar políticas públicas essenciais — acenderam um alerta entre economistas e analistas políticos.
A palavra de Maílson da Nóbrega: um alerta severo
O ex-ministro da Fazenda Maílson da Nóbrega criticou duramente a aprovação da pauta-bomba e classificou a postura do Senado como uma violação aos princípios constitucionais. Para ele, benefícios permanentes e aumento de gastos não podem ser instituídos por meio de emenda constitucional.
Maílson foi categórico ao alertar que a classe política “não aprendeu nada” e segue agindo sem responsabilidade fiscal. Segundo ele, parlamentares aprovam medidas de alto custo porque não são responsabilizados por seus impactos — e o prejuízo recai sempre sobre o governo de plantão e, em última instância, sobre a sociedade.
Para o ex-ministro, a aprovação dessa medida escancara um padrão perigoso: o Congresso percebeu que pode avançar em agendas populistas e de estímulo corporativista sem enfrentar consequências institucionais, ampliando o risco de uma crise fiscal séria caso essa lógica continue a prevalecer.
Quem perde com esse conflito de egos?
A sociedade
Pautas voltadas para autoproteção parlamentar — como a PEC da Blindagem — enfraquecem o combate à corrupção e comprometem a segurança pública. Ao atacar instituições de fiscalização, o Congresso afasta o país de um sistema de Justiça acessível, transparente e funcional.
As contas públicas
A pauta-bomba aprovada pelo Senado ameaça o equilíbrio fiscal. Medidas sem planejamento e com impacto bilionário podem comprometer investimentos essenciais, como saúde, educação e infraestrutura.
A governabilidade e a credibilidade do Estado
A deterioração das relações entre Executivo e Legislativo enfraquece a democracia. Conflitos pessoais transformados em projetos de lei e votações relâmpago ameaçam a previsibilidade econômica e a imagem internacional do Brasil.
Institucionalidade ou revanche política?
O Brasil vive uma encruzilhada decisiva. As ações de Hugo Motta e Davi Alcolumbre não são episódios isolados: representam um movimento crescente de autoproteção parlamentar, retaliação política e desprezo pela responsabilidade fiscal.
Um flanco perigoso para a democracia
Se esse padrão persistir, o país corre o risco de retroceder décadas em transparência, estabilidade institucional e credibilidade econômica. Cabe ao Congresso escolher se continuará servindo à democracia — ou se tornará palco permanente de disputas pessoais e agendas destrutivas.
