Crianças em Conflitos Armados: ONU alerta para recorde de violações graves em 2024

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Mais de 22 mil crianças foram vítimas de abusos em zonas de guerra no ano passado; mortes, mutilações, estupros e fome estão entre os principais crimes.

Um novo relatório da Organização das Nações Unidas revelou um dado alarmante: em 2024, pelo menos 22.495 crianças foram vítimas de graves violações em conflitos armados em todo o mundo. O documento, intitulado “22.495 Gritos Assustadores”, foi lançado na quinta-feira (20) e denuncia um aumento de 25% em relação ao ano anterior, o maior já registrado desde a criação do mandato da ONU sobre Crianças e Conflitos Armados, há quase 30 anos.

Entre os crimes mais recorrentes estão mortes, mutilações, estupros, negação de acesso humanitário e recrutamento de menores por grupos armados. O relatório destaca que 11.967 crianças foram mortas ou mutiladas, tornando essa a violação mais prevalente. Além disso, 7.402 foram recrutadas para combates e 7.906 tiveram acesso negado à ajuda humanitária.

Zonas mais afetadas

Os países que mais concentram essas atrocidades incluem Israel e os Territórios Palestinos — especialmente a Faixa de Gaza —, República Democrática do Congo, Somália, Nigéria e Haiti. O relatório chama a atenção ainda para Moçambique, o Líbano e o Haiti, que registraram aumentos acentuados nas violações graves contra menores.

Moçambique é o único país lusófono citado e preocupa pela reincidência de ataques insurgentes no norte do país, especialmente na província de Cabo Delgado, onde comunidades inteiras continuam deslocadas e vulneráveis.

200 mil libertações desde 2005

Apesar do cenário sombrio, há também sinais de esperança. Cerca de 16,5 mil crianças antes associadas a forças ou grupos armados receberam apoio para reintegração social em 2024. Desde 2005, a ONU estima que mais de 200 mil crianças tenham sido libertadas e auxiliadas na reconstrução de suas vidas.

No entanto, a representante especial do secretário-geral da ONU para Crianças e Conflitos Armados, Virginia Gamba, fez um apelo dramático à comunidade internacional:

“Essas 22.495 crianças não deveriam estar aprendendo a sobreviver a tiros, mas sim a ler, brincar, viver. Estamos diante de um ponto sem retorno.”

Falta de respeito ao Direito Internacional

O relatório aponta ainda que o aumento da violência está diretamente ligado à falta de respeito às normas do Direito Internacional Humanitário, ao uso indiscriminado da força, ataques a áreas civis, rompimento de cessar-fogos e à deterioração das crises humanitárias.

Para a ONU, é essencial que as partes em conflito respeitem os princípios fundamentais da guerra, como distinção, proporcionalidade, necessidade e humanidade. O texto também pede o fim da “guerra contra as crianças”, termo utilizado por Gamba para resumir o cenário cruel em que os menores estão sendo colocados.

Compromisso global e urgente

O documento não apenas denuncia, mas também propõe ações concretas. Um novo acordo regional de monitoramento de violações contra crianças em conflitos armados foi criado com o apoio da ONU, e a entidade pede um renovado compromisso universal para proteger os direitos da infância em contextos de guerra.

O relatório é mais um alerta de que, sem um esforço conjunto e urgente da comunidade internacional, milhares de crianças continuarão a sofrer em meio a conflitos que elas não causaram — e cujas cicatrizes podem durar toda a vida.