
Um estudo inédito do Movimento Pessoas à Frente, com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), revelou que os gastos da Justiça com supersalários cresceram 49,3% entre 2023 e 2024. Esse aumento elevou o total de R$ 7 bilhões para R$ 10,5 bilhões pagos acima do teto constitucional — em contraste com a inflação de 4,83% no período.
Verbas “indenizatórias” driblam o teto
A pesquisa demonstra que os chamados “penduricalhos” — verbas indenizatórias e adicionais — já superam 43% da remuneração líquida média dos magistrados, e podem ultrapassar, em breve, 50%. Atualmente, o teto do funcionalismo, com base nos subsídios de ministros do STF, é de R$ 46.366,19. Entretanto, graças a esses extras, muitos magistrados recebem substancialmente mais — sem tributação — sobre essa parte do salário.
Salários saltam de R$ 45 mil para R$ 66 mil
Em 2023, o rendimento líquido médio de juízes era R$ 45.050,50. Em 2024, subiu para R$ 54.941,80 — totalizando alta de 21,95%. Em fevereiro de 2025, já alcançava R$ 66.431,76. Essa disparada foi atribuída às verbas classificadas como indenizatórias, que escapam do teto e da tributação de Imposto de Renda.
Brecha estrutural há décadas
Jessika Moreira, diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente, avalia que os supersalários são resultado de uma brecha estrutural que data da Constituição de 1988. Segundo ela, embora tenha havido tentativas legislativas para conter o fenômeno, nenhuma foi eficaz. O movimento alerta que, no ritmo atual, os gastos com supersalários podem dobrar nos próximos dois anos.
Repercussão política e judicial
No começo de 2025, o ministro Gilmar Mendes, do STF, declarou que o país vive “quadro de verdadeira desordem” em relação a esses pagamentos e pediu que se estabeleçam normas claras para conter o avanço do sistema. Reportagens do UOL demonstraram que nove em cada dez juízes receberam, em 2024, valores superiores aos vencimentos dos ministros do Supremo. O UOL estimou ainda que 9 de 10 conselheiros de tribunais de contas tiveram remuneração média de R$ 66 mil mensais — acima até da média do STF — graças às mesmas práticas ..
Propostas em debate
O Movimento Pessoas à Frente forma uma coalizão com dez organizações da sociedade civil e apresenta à Câmara, sob coordenação do deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), nove medidas para enfrentar os penduricalhos. Entre as propostas figuram:
- Classificar corretamente o que é verba remuneratória ou indenizatória;
- Limitar benefícios a critérios transitórios e legais;
- Tributação adequada das verbas sobre o teto;
- Reforço da transparência e governança;
- Criminalização de pagamentos ilegais via improbidade administrativa;
- Proibição de retroativos fora de prazo.
Em novembro de 2024, o governo apresentou uma PEC visando limitar exceções ao teto, prevendo prazo de dois anos para validarem benefícios, mas sem estimar o impacto financeiro.
Conclusão
O crescimento quase exponencial dos supersalários revela um problema complexo, impulsionado por brechas legais e escassa governança. O debate no Congresso e no STF sinaliza que há um reconhecimento político da gravidade do tema. Contudo, resta definir até que ponto o país disporá de instrumentos eficazes para impedir que a exceção se torne a regra.